segunda-feira, 9 de setembro de 2013

A problemática da teoria moral jurídica. Autor: POSNER, Richard. São Paulo: Martins Fonte, 2012

A leitura sobre teoria do direito, temas morais da obra “ A problemática da teoria moral jurídica”, de autoria de Posner, Richard revela uma abordagem extremamente reflexiva sobre a teoria moral e constitucional como a forma mais recente de “mistificação jurídica”, relacionando com a teoria do direito a temas morais e jusfilosóficos desde Jurgen Habermas, J.L. Hart até Ronald Dworkin. Inicialmente, o autor contextualiza o leitor nos esforços dos intelectuais do direito em relutar na concepção de como a teoria do direito esta eivada da teoria moral nas mais diversas vertentes do direito como o positivismo jurídico, o jusnaturalismo, a hermenêutica jurídica, o formalismo e o realismo jurídico. Explica que a teoria moral tem um grande envolvimento com a jusfilosofia que caracterizada pela pretensão a universalidade. Na visão de Hart “...é o direito como um sistema de normas”. Positivista que é, reconhece que algumas causas que não são “regulamentadas juridicamente”, e que os juízes exercem a função de legisladores não eleitos e que devem proceder com simplicidade quando suas decisões são desvinculadas da lei. Rejeita a doutrina constitucional da common law e à política. Já, para Dworkin “....os juízes não criam, mas simplesmente aplicam o direito ao decidir uma causa...” e por essa razão os juízes atuam profissionalmente dentro de suas atribuições profissionais e não precisam julgar com parcimônia uma causa. Defende ainda que o direito não é para ditar regras e normas formais, mas que os princípios morais devem estar inseridos nos julgamentos dos juízes quando criam novas normas. Adere o referido pensador ao método da common law, sistema constitucional americano. Patrick Devlin, positivista mais enfático que Hart, reconhece que os magistrados as vezes “esticam o direito”, ou seja, ele não admite a influência dos “sentimentos morais” dentro do conceito de direito. O sócio-democrata Habermas criador da teoria da “ação comunicativa”, ou “teoria do discurso”, crê não haver legitimidade “...o direito natural (o direito como moral), ou pelo positivimo jurídico ( o direito como um corpo de normas promulgadas pela autoridade constituída)...” e que a o direito não terá eficácia sem o aceite da autoridade moral do direito. E diante desse paradoxo entre o direito natural e a coerção ou outras formas de corrupção a única forma dos cidadãos conviverem em equilíbrio diante de um mundo globalizado e de garantir a subsistência do sistema jurídico as suas críticas é pela democracia. A supremacia da lei é identificada como o princípio da legalidade que vai se estabelecer frente à administração, à jurisdição e aos cidadãos. O Direito é reduzido à lei, excluindo-se as demais fontes e revelando a origem do positivismo. A lei ganha toda essa importância porque é considerada um produto da razão que tem como características a abstração, relavada no abandono da dicotomia do justo e injusto, tendo como objetivo central do direito a pacificação social e não mais a justiça; bem como a generalidade, que define a lei como de aplicação geral, uma vez que vale para todos, e consagra ideais de igualdade, segurança jurídica e legalidade, destinando-se a situações futuras. Há uma mudança de titularidade da soberania, que passa do monarca (no absolutismo) para a lei, com proeminência do poder Legislativo, instituindo um processo democratizador. Aqui o judiciário tem um papel tímido, e ao juiz é consagrado um papel de “boca da lei”, sendo proibido de interpretar a lei, devendo apenas aplicá-la ao caso concreto – subsunção. Neste período a lei é plena, contém todo o direito e é desprovida de deficiências. Não há necessidade de interpretações ou de reflexões, uma vez que a lei não tem lacunas. Convenhamos que tais afirmações soam um tanto quanto ingênuas, pois se sabe das deficiências e lacunas das leis, atos jurídicos dotados de subjetividades legislativas até os dias atuais. Visava assegurar a segurança jurídica, instituindo-se um novo sistema de liberdade, igualdade e fraternidade através da norma jurídica. Na França havia desconfiança com relação ao judiciário, que ficou limitado, ao contrário do que aconteceu nos Estados Unidos, onde a desconfiança se dava em relação às leis e assembleias tendo um judiciário ativo, o que origina o ativismo judicial e o controle de constitucionalidade onde todo e qualquer juiz é apto para afastar a aplicação de determinado ato legislativo considerado contrário à constituição. Nesse modelo, cabia à constituição estabelecer apenas a estrutura básica do Estado, com seus poderes e suas respectivas competências e a essência dos direitos fundamentais. No pós 2ª Guerra Mundial as constituições comunitárias são políticas, pois englobam os princípios de legitimação do poder e não apenas a sua organização. Desse modo, o campo constitucional é ampliado. As mudanças implementadas no começo do séc. XX, especialmente pelas flagrantes desigualdades que são geradas pelo princípio da igualdade jurídica, já que havia a plena liberdade de mercado e o Estado não intervinha na esfera privada, dão origem a movimentos sociais que começam a reclamar uma atuação positiva do Estado, que deveria deixar de ser ausente e passasse a consagrar direitos. É o surgimento do chamado Walfare State (Estado de Bem-Estar Social). No Estado de Bem-Estar Social o princípio da igualdade deixa de ser vislumbrado apenas na sua perspectiva forma, para converter-se em elemento material, onde se consagra a igualdade social. Aqui o Estado é chamado a intervir para promover direitos sociais, sendo esta intervenção direta, uma vez que exige-se que este promova bens e serviços, consagrando as chamadas prestações positivas. Para que este Estado seja possível, faz-se necessário tratar as situações desiguais de modo desigual, o que se chama de discriminação positiva. Alguns autores entendem que o Estado do Bem-Estar Social não é verdadeiramente um novo modelo de Estado, mas tão somente uma adaptação do modelo liberal, que passa a atender as necessidades sociais através do incremento de serviços sociais, especialmente de saúde e educação. A partir de então o catálogo de direitos econômicos, sociais e culturais são constitucionalizados, passando a constituição a ser também um programa de ação para governados e governos. Promove-se a aproximação do Estado com a Sociedade, algo impensável anteriormente, onde as esferas do público e do privado eram absolutamente estanques. A política é trazida para dentro da constituição e do direito, que consagram normas programáticas que terão sua executoriedade postergada, uma vez que são entendidas como normas de caráter compromissória. A autora refere que efetivação destas normas é levada para um futuro incerto, o que não tem como discordar, porquanto ainda se percebe essa característica das normas programáticas. Nesse modelo de Estado há uma predominância do Poder Executivo, essencial para a realização dos direitos de segunda dimensão. O modelo do Estado de Bem-Estar Social precede o do Estado Democrático de Direito. Aqui a constituição assume uma função essencialmente principiológica, sendo que as decisões sobre as questões constitucionais passam a ser atribuição do Poder Judiciário. A instrumentalidade dos valores constitucionais e aferição da conformidade ou não das leis ao texto constitucional se estabelece através do mecanismo da jurisdição constitucional. Há uma premente necessidade de concretização de direitos, portanto, o foco passa ao judiciário, mas essa transferência da esfera decisionária relativamente as questões constitucionais não ocorre de forma tranquila ou consensualizada. No final de 1920, relata a autora, que Karl Schmitt e Hans Kelsen travaram um debate sobre a quem caberia legitimamente a competência de zelar pela constituição. Evidentemente que as posições eram contrapostas, com a defesa da competência do executivo, como se entendia no Walfare State ou na atribuição ao judiciário. Para Schmitt esta função deveria caber ao füher, pois o judiciário não apresentaria condições necessárias para abraçar tais atribuições, pois não teria como manter o sistema jurídico e político, e também porque o chefe do executivo, por ser eleito pelo povo, representaria a vontade da maioria, uma vez que sua posição era central e neutra. Mais uma vez, não se pode concordar com tal assertiva, posto que é evidente que o executivo, por ser órgão político, não reúne condições suficientes para análise de cunho eminentemente jurídico. Já no entendimento de Kelsen, em toda a sentença existe um elemento de decisão, de exercício de poder e, portanto, não há porque se rejeitar a existência de um órgão específico que ficaria encarregado de exercer tal tarefa. A posição de Kelsen sagrou-se vencedora, contudo, percebe-se que esta sofreu profundas transformações. Surge o controle concentrado de constitucionalidade, diferente da judicial review norte americana, que tem caráter difuso, pois vai confiar apenas ao Tribunal Constitucional a tarefa de preservar a constituição. Assim, prevalecendo a supremacia da constituição, passou-se a eliminar toda a lei que a desrespeitasse, a fim de manter a coerência do sistema jurídico. Os Tribunais Constitucionais passam a ser instâncias de preservação dos valores supremos insculpidos no texto da constituição. Os direitos difusos e transindividuais se instalam, com destaque aos direitos de solidariedade, do consumidor e ambiental. São os direitos de 3ª dimensão, que exigem para sua manutenção a forte atuação do Poder Judiciário, destacado neste modelo estatal e que acaba desvirtuando as ideias kelsenianas em função do forte ativismo que se implementa nos tempos hodiernos.
Dra. Elisangela Furian

Nenhum comentário:

Postar um comentário